Eu também não gostava de sexo casual

09 de abril de 2025

Eu também não gostava sexo. Ponto.

É esse o texto, mas sabia que seria muito forte para a gente começar.


Na verdade, eu achava que não gostava de sexo. Na verdade, eu colocava vários empecilhos que me afastavam de fato do ato sexual. Eu dizia que transar para mim era muito importante, afinal, isso seria o suprassumo da intimidade. Eu era uma adolescente quando sonhava com um príncipe que tiraria minha virgindade. Sim, esse príncipe nunca existiu, mas eu seguia com a ideia forte que encontraria ele em algum lugar. Ideia inconsciente, é claro, nunca tive em concretude o príncipe, aliás, nunca quis que alguém me salvasse, mas eu acreditava que precisava ser salva para começar minha vida.


Como escrevi no texto anterior, eu tive uma educação bem rígida e pautada no corpo. Talvez um dia eu fale sobre isso, mas agora o que posso dizer é que se tem algo que essa educação me ensinou, foi que o meu corpo ditava as regras do mundo. Eu tinha que ter um corpo atraente, bonito e saudável, senão, não ia arrumar nada nem ninguém (ouvia isso todos os dias). Isso foi me desaproximando do sexo. Tinha muito complexo com meu corpo, achava que sempre existia algo de errado nele. Como então eu ia me dar ao luxo de deixar com que ele desse prazer a outra pessoa ou a mim mesma?


Foi aí que eu comecei a colocar vários empecilhos para transar - sem perceber.


Ao invés do príncipe, mudei para "demissexual" e aqui quero fazer uma ressalva: sei que existem pessoas que se intitulam assim, mas é importante a gente pensar sobre a nossa própria forma de se definir. O que eu quero dizer é que eu me definia como uma pessoa que só transava por atração romântica porque, na verdade, eu tinha muito receio do sexo, da entrega que o sexo tem. Eu não me sentia capaz nem segura para transar, na verdade. Mesmo quando eu tinha algum envolvimento amoroso com alguém, o sexo não era prazeroso para mim. Eu tinha muitas correntes internas que afloravam no sexo, então eu o evitava. Passei mais de dois anos sem transar, evitando, dizendo que transar por transar não era para mim, esperando de alguma forma esse príncipe, tentando gostar de alguém "de verdade" para a coisa fluir. E aqui eu coloco "de verdade"  em aspas porque as pessoas que eu transo hoje eu tenho, sim, um carinho. Eu depositava nesse "de verdade" a chance de fazer superar todos os traumas que vivi envolvendo meu corpo e o sexo, com isso eu adiava uma descoberta profunda nesse tema que sempre foi bem delicado para mim.


Hoje eu tenho compreensão de como minha mente funciona, mas houve um tempo que eu acreditava piamente nos meus medos. Vocês entendem o que eu quero dizer? Às vezes a gente se conta histórias para continuar no (des)conforto, porque ele é o lugar conhecido da nossa mente. Ninguém quer sofrer, isso é fato, mas às vezes ficamos estagnados por acreditar demais nas mentiras que contamos a nós mesmos.


Cada um de nós tem uma versão de si mesmo, e às vezes essa versão não é fidedigna com o que você seja de fato. Eu, por exemplo, nunca me imaginei sendo prostituta - e ainda sendo tão feliz nessa profissão - e hoje tenho sido uma. Se eu tivesse acreditado na versão recatada de mim, eu nunca tomaria esse passo de entrar nessa profissão. Essa versão recatada era a versão do medo.


Acho também que por vezes confundimos os conceitos. Fui entendendo que, para mim, é importante existir uma troca, uma conexão, eu tenho necessidade de conhecer a outra pessoa que estou fazendo sexo. Então, o meu casual, apesar de ser casual, é sentido completamente naquele momento, tem entrega, tem carinho. Eu valorizo isso. O amor é um valor muito importante para mim e ele está em tudo, até nas trocas casuais. Como eu vivo dizendo por aí: não é só sexo. Não acredito que as coisas são somente uma coisa, acredito sempre que há vários fatores envolvidos. E fui entendendo que eu não gostava das trocas frias, que eu valorizava uma pessoa que quisesse tocar no meu corpo com carinho e respeito, que me tratasse com gentileza e não como se eu fosse um objeto prestes a satisfazer os desejos dela. Disso é que eu não gosto, disso é que eu não quero para minha vida. E sabe como as minha relações de sexo eram? Eram assim, de eu sendo um objeto, não aproveitando nem tendo prazer.


Entenderam porque fui me fechando e me intitulando demissexual? A questão era bem mais profunda: eu que precisava buscar meu próprio prazer nessas relações, meus limites, meu orgasmos. Eu deveria procurar pessoas que quisessem o mesmo comigo, que não me visse somente como um corpo-depósito-de-porra. Eu fui por muito tempo isso, afinal, eu aprendi desde a infância que meu corpo não valia nada, como que eu ia mudar isso de repente?


Hoje eu já consigo dizer que sou uma mulher que gosta de sexo, sim, e que gosta da sensação de encontrar um desconhecido para transar, que isso me excita, que me faz superar os meus próprios limites internos e me faz me sentir muito desejada, o que é um gás para minha libido. São nas relações casuais que tenho descoberto o meu prazer, o tipo de toque que eu gosto, a forma como eu quero ser tratada e olhada. Meus orgasmos, o relaxamento, a entrega, o carinho, por mais que sejamos dois estranhos, há um carinho mútuo: nós dois queremos estar ali e estamos cem por cento presentes. Essas relações não são menos para mim, na verdade, são elas que têm me ensinado sobre mim mesma. Se eu tivesse com a ideia fechada de que não conseguiria transar assim, talvez nunca tivesse chegado nesse ponto de me conhecer sexualmente, pois também não sou a pessoa que quer casar e ter filhos tão cedo.


Sei que cada um tem sua vivência particular e há pessoas que realmente não conseguem transar sem envolvimento amoroso. Mas vai que você também é como eu e só precisa se permitir mais um pouco?


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